segunda-feira, 28 de junho de 2010

Comparações (Aparecido Raimundo de Souza)

Quando encontrei este texto de Aparecido, imaginei esta imagem, porque é assim que penso no que é GOSTAR de alguém. Algo puro, verdadeiro e sem interesses, sem exigências, gostar com o coração e não com os olhos, satisfazer o coração a alma e só depois o corpo - Aparecido conseguiu traduzir tudo isso, nestas belas palavras que falaram ao meu coração, com certeza encantará o coração de quem o ler e sugiro que leiam, enriquecerá a vida sentimental de cada um. Este texto é na verdade sem comparação. Silviah Carvalho


Gostar de alguém não é morar em São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília ou qualquer outra cidade importante, mas morar com ela, de preferência dentro de seu coração. Gostar de alguém é lhe dar as mãos estendidas de carinho, depois de lhe ofertar a vida com esperanças de um porvir melhor. Gostar de alguém é participar ativamente do seu dia a dia, ouvir e entender sem fazer sombras por menores que sejam em suas idéias. Gostar de alguém é apoiar todos os seus planos, sejam eles quais forem mesmo os mais loucos e desconexos, incentivá-la sempre lhe dando o apoio moral necessário, perseverando juntos, como se fossem uma só pessoa e, sobretudo, não abandonar, jamais, a própria personalidade. Gostar de alguém é chegar de mansinho, acompanhar, ver e sentir, compreender e não fazer perguntas desnecessárias, nem meter o nariz aonde não foi chamado. Gostar de alguém é confiar plenamente nela e envolvê-la com doçura, com muita ternura, fazê-la se sentir cativa da sua presença, prisioneira dos seus desejos; porém, sem querer saber se existe o lado contrário, a parte escura, o esconderijo secreto, porque amando e, conseqüentemente gostando de verdade, com a alma, nunca, durante esse tempo, será tão imensa a contrariedade.
Gostar de alguém é uma coisa muito sublime e por demais complexas. Algo que às vezes está longe e acima do alcance das nossas vontades e entendimentos. Gostar de alguém é como buscar a Deus sem intermediários, sem meios termos. Gostar de alguém é dar e doar a alma e não esperar calculadamente pelo espírito. Gostar de alguém é passar a noite sonhando com ela, imaginando-a nos braços, gozar esses instantes como se fossem eternos e não se preocupar se dia seguinte, o sol quente ou o vento forte vierem interromper suas fantasias batendo forte nas vidraças da janela. Gostar de alguém é tentar ser sempre o prometido, o príncipe encantado dos contos de fada; aquele cavaleiro solitário que chegará de um momento para outro montado num lindo cavalo alazão e depositará, cheio de reverência, um beijo em meio a sua testa, como o Romeu eterno buscando a sua Julieta perfeita – gostar de alguém é fazer o impossível dentro do possível para não quebrar o encanto e nunca - nunca cobrar as promessas que não vingaram. Gostar de alguém é ter silencio no instante exato, respostas firmes na hora precisa, no minuto derradeiro e, ainda, ter o sopro da vida em abundância, para tentar suprir o vazio, a lacuna deixada por alguém que o destino levou para longe, numa viagem por entre estrelas de primeira grandeza, mas que se sabe, não terá volta. Gostar de alguém é gritar, pular e fazer sorrir a companheira de todas as horas. É transformar o feio numa flor perfumada e de rara beleza, é esculpir a amada num quadro indescritível, mesmo quando pintar em seu rosto o mau humor das incoerências, ou as horas tristes de angustias e aflições insistirem em marcar presença constante ao seu lado.
Gostar de alguém é entender sempre e não querer ser o eterno entendido. Gostar de alguém é acompanhar a ilusão, passo a passo, enquanto ela existir, procurar vive-la sem cogitações e como a uma fogueira, alimentá-la e intensificá-la sempre, “ad eternun”. Gostar de alguém é saber a hora, o instante exato de se afastar antes do tédio e da monotonia baterem a porta; do copo transbordar todas as mágoas guardadas e, ainda, das lágrimas brotarem por pequenas coisas que não foram ditas. Gostar de alguém é passar por cima dos problemas que ficaram sem solução, é saber como chegar ao minuto fatal de dizer adeus sem constrangimentos, e ao fazê-lo, manter a cabeça erguida, sem a expectativa da volta ou de uma nova reconciliação. Gostar de alguém é se render de corpo inteiro, sofrer por amor até a exaustão, mergulhar de cabeça, às cegas, num vôo desconhecido, como Ícaro em busca do sonho imperfeito, ou como o andarilho, cujo paradeiro da sua jornada, ignora o desfecho que lhe aguarda no final da longa estrada. Gostar de alguém é dizer coisas lindas, é sussurrar juras de afeições profundas, é sentir as entranhas queimando, o corpo ardendo em febre de quarenta graus, é sentir a alma leve e solta, a vida fluindo como se fosse uma pluma na imensidão, é ter o coração batendo acelerado, descompassado, como se quisesse, de repente, saltar peito afora, criar asas e voar por espaços nunca imaginados. Gostar de alguém é efetivamente nunca se arrepender, amanhã, depois, ou algum dia (sempre há um dia), por ter se entregue tanto, por ter anulado sonhos, ou deixado de fazer isto ou aquilo. Gostar de alguém é perder o rumo, o prumo, o pulso, a visão do que é certo ou errado, a ponto, inclusive, de não saber o caminho da volta, o porto amigo para tentar reconstruir a si mesmo dentro do vazio enorme que ficará martelando, pungente, como uma ferida aberta que se nega a cicatrizar. Gostar de alguém é ter coragem suficiente para correr atrás dela no instante exato em que ela tomar a decisão de sair pela porta afora, com as roupas do corpo, deixando no ar, um vazio grande demais, uma inquietude que logo se transformará em solidão.

7 comentários:

  1. Realmente é um belo texto, um ensinamento, creio que Gostar de alguem é doar-se, servir como disse o poeta Aparecido, gostar é amar em uma outra esfera.
    Blog lindo e proveitoso.

    Gilmar Américo Lima - Palmas-TO

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  2. Muito bom e verdadeiro seu texto,parabéns

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  3. Esse tal de Aparecido me tirou o fôlego e tambem todas as palavras da boca. Fiquei muda. Ele disse tudo o que é gostar de alguem. Pronto. Gostar de alguem é isso. Não há mais comparações a serem feitas. Deu o recado, mandou bem.
    Cindy Campos
    Ituiutaba Minas Gerais

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  4. Silviah, eu não sei o que dizer, só peço sua permissão para que eu possa guardar pra mim esse texto para que eu possa relê-lo sempre que eu sentir vontade(só para mim, com a autoria claro), é perfeito, descreve em minúcias o que é o gostar, chegando ao amor!
    Um beijo
    Ju

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  5. Cara, espetacular! este é o verdadeiro Gostar.
    ótimo.

    Armando Silveira
    Palmas/TO

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  6. Aparecido e seus textos maravilhosos. Sempre nos surpriendendo. Como comparar estas "Comparações" sérias, tiradas do fundo da alma com o cômico e tambem incomparável "Toc", texto literalmente pitoresco onde ele descreve os medos e fala das preocupações que sente em pegar uma doença sexualmente transmisivel da namorada e, por conta disto, começa a colecionar uma série de objetos inuteis, como cartões telefonicos, revistas velhas, tampinhas de garrafas e rolhas? Nos dois textos, "Comparações" e "Toc", podemos sentir todo o lirismo, a soberba, a criatividade e claro, a maestria do escritor por detrás do homem que brinca com as palavras a seu bel prazer.

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  7. Encontrei, por acaso, as Comparações de Aparecido Raimundo de Souza numa antologia editada aqui em Portugal, livro Escritos de além mar, organizado pelo poeta e escritor Lisboense, o portugues Manoel Consuello em uma de minhas visitas a Casa dos livros. Isso tem um mês, se não me falha a memoria. Sempre busco ler coisas novas, coisas que me chamem a atenção, no lugar de me ater a crimes ou me preocupar com a politica. E esse texto do Aparecido, me apareceu (desculpe o trocadilho) em boa hora. Apareceu num momento da minha vida em que eu buscava exatamente o que é gostar de alguem. Mas gostar de modo profundo, de modo serio, de modo convincente. O gostar desse escritor não se equipara a gostares vazios, destituídos da beleza do coração, da situleza da alma, mas a gostares mais complexos, como aqueles que deixam marcas profundas, que não acabam, que não se rompem, que não se esvaem com o tempo. O verdadeiro gostar é este, tal como bem descreve Aparecido. Um gostar que sabe diferenciar o momento de dizer adeus, ou não, sem se deixar ser carcomido pelas garras invisíveis da solidão.
    Agripino
    contato@festivaldeteatroinfantil.com.br
    www.festivaldeteatroinfantil.com.br

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